sexta-feira, 18 de maio de 2012

REDAÇÃO JURÍDICA: VEJA TEXTO COM ORIENTAÇÕES ORIGINAIS DO SIA PARA A ATIVIDADE DE NARRATIVA PARA AV2


O texto base utilizado nesta aula possibilita compreender as muitas versões que um fato pode promover. A modalização em certos trechos é evidente. De forma semelhante, autor e réu constroem suas versões sobre os fatos juridicamente importantes da lide em que estão envolvidos.
Ao parecerista, porém, cabe compreender a totalidade dos eventos relevantes ocorridos e selecionar tudo quanto possa orientar uma opinião técnica, justa, fundamentada.
Em outras palavras, é função de um parecerista apreciar com cautela todas as informações recebidas e conjugá-las em uma narrativa imparcial que auxiliará na solução justa do conflito jurídico.

Questão
Partindo do raciocínio anteriormente exposto, pede-se a leitura de cinco versões sobre um fato e, em seguida, a produção de uma narrativa imparcial. Esse procedimento auxiliará, posteriormente, na produção dos relatórios jurídicos.

Quem é Jorge?[1]
Relato das pessoas sobre o ocorrido no dia X.

Relato do garçom: Eu conheço Jorge. Todas as noites está aqui caladão, olhos de conquistador, cigarro e uísque... Não é de hoje que ele vem seguindo uma lourinha que vem algumas vezes aqui. Ele olha a moça como quem quer devorá-la viva, mas não diz nada... Parece ter medo! Ontem, no entanto, saiu atrás dela, bateu a porta e não pagou a despesa. Esse Jorge é um “BOA VIDA”, um sabidão. Deve tomar dinheiro das garotas com aquela cara de anjo...

Relato da vizinha: Ai! Meu Deus, não sei se telefono à polícia ou se chamo D. Sofia no plantão. Aconteceu um crime no apartamento do Jorge. Eu nunca me enganei com esse cara!
Jorge é tarado, um criminoso. Eu vi, ninguém me contou. A moça deitada, toda nua num sofá, com a cabeça caída, e sob ela uma poça de sangue. Jorge com uma faca na mão ao me ver correu atrás de mim e eu apavorada tranquei-me no apartamento da madame e ele ainda esmurrou a porta. Ele queria me matar! Deus me livre! Cruzes!

Relato da mãe de Lúcia: Lúcia nunca fez isso... São cinco e quinze da madrugada e ela não chegou! O que terá acontecido com minha filha? Lúcia não tem namorado. Sai do escritório, faz um lanche no barzinho e volta cedo para pintar seus quadros. Às vezes vai à casa de um coleguinha, mas nunca o faz sem me avisar. Dormir fora de casa? Não! Nunca dormiu!
E se o pai dela acorda e sabe que ela não voltou... Lúcia é uma menina ingênua, gosta de um rapaz, mas não deixa que ele saiba. Tem medo de demonstrar que simpatiza com o moço e que ele possa considerá-la frívola. Acha-o simpático, triste, tão sozinho... Lúcia poderia conseguir um namorado, pois lhe serviria de companhia, ao menos. Que terá acontecido com minha filha! Se ela não chegar até as seis horas, terei de tomar uma providência...

Relato do pai de Jorge: A situação de Jorge me preocupa. Largou os estudos; vive trancado naquele quarto, não trabalha... Se eu morrer de uma hora para outra, que será de Jorge? Dou-lhe tudo, mas não consigo a sua amizade, nem ao menos a sua companhia... Nunca o vi com namorada e ele encontrasse uma moça de boa família, poderia normalizar sua vida...
Depois da morte de sua mãe, Jorge sumiu de casa, apareceu um dia pedindo-me uma mesada e solicitando-me que deixasse viver a sua vida...
Paulo, seu irmão, é mais novo, mas está formado, trabalha numa companhia de mineração onde é o Engenheiro Chefe. Paulo sempre foi mais estudioso, inteligente; aliás, o melhor aluno do colégio. Jorge nunca deu para os estudos... Anda, agora, às voltas com mulheres, bebendo... Vi-o, ontem, com uma loura... Esse rapaz vai liquidar a sua mocidade e a sua saúde.
Preciso falar com meu filho!

Relato do Jorge: Eis, a seguir, como Jorge relata o que ocorreu no dia X.
Quando mamãe morreu eu tinha 16 anos; Paulo, meu irmão, 14. Fiquei só porque papai sempre gostou mais de Paulo. Paulo é que sabia tudo, Paulo é que seria o orgulho da família...
A morte de mamãe foi um golpe para mim. Só para mim, pois papai não necessitava de mamãe: tinha outra companhia. Paulo foi levado para o Rio, onde estudou Engenharia. Foi entregue ao tio Celino, homem de recursos e posição. Sempre gostei de arte. Nunca fui bom aluno, bem sei, mas tinha desde menino, uma inclinação acentuada para o desenho no colégio. Mamãe ficou muito satisfeita, mas papai disse-me apenas que aquilo não significava muita coisa, que eu deveria imitar Paulo estudando mais...
Minha vocação era aquela. Resolvi estudar pintura e hoje tenho um atelier no pequeno apartamento onde moro, que aluguei com os recursos que meu pai me dá. Dou aulas em casas de família e ganho para as minhas telas, os meus pincéis, as minhas tintas e o meu uísque, que não chega a ser um vício, mas um meio de abafar a solidão.
Conheci há alguns meses uma moça, sei agora que se chama Lúcia. Apaixonei-me por ela sem nunca haver dito. Queria consagrar a minha melhor obra a essa moça e martirizei-me com a ideia de pintar o seu retrato... Pintá-la toda na perfeição de seu corpo e na beleza de seu rosto...
Ontem à noite não resisti. Ao vê-la sair do bar, onde habitualmente nos encontramos, corri atrás dela e quase em desespero, disse-lhe quem era e o que queria. Disse-lhe mais: que a amava.
Recebi um sorriso fraterno. Só minha mãe sorria assim para mim... Parecia que já nos conhecíamos há muito. Lúcia não se opôs a ideia de acompanhar-me ao apartamento. Disse-me apenas que era uma moça pobre, que gostava de seus pais e não queria voltar levando tristezas para eles, nem amargura para sua vida.
Lúcia mostrou-se confiante. Assim, caminhamos os dois, a pé, até o meu apartamento.
Lúcia ficou encantada com os meus quadros. E eu, com o seu talento. Dei-lhe tinta e pincel e ela passou a noite a fabricar uma tela que eu chamei de “infância”, porque era pura e ingênua...
Depois Lúcia pousou para mim e eu trabalhei até as cinco horas da madrugada, diante do melhor modelo, do mais perfeito modelo que já tive. Pintei-a com amor e ela com amor deixou-se pintar...
Lúcia dormiu depois de três horas em que esteve imóvel diante de mim, deitou-se no sofá, cabelos caídos e dormiu. Tinha, no entanto, derramado no chão um vidro de guache vermelho e eu, mesmo cansado, fui remover com uma faca de limpar telas, a tinta derramada no chão.
Quando Raimundinha, a moça que mora no apartamento ao lado, passou no corredor, quis falar-lhe para que trouxesse alguma fruta, leite e ovos. Raimundinha parecia estar apavorada e correu. Fui atrás dela para explicar-lhe o meu desejo. Ela trancou-se por dentro, assustada!...
Lúcia acordou às sete horas. Fui levá-la em casa e, pessoalmente, expliquei a sua mãe o que ocorreu. Lúcia e eu ficamos noivos e casaremos brevemente. Iremos, juntos, participar de uma Exposição Nacional de Pintura. Sei que o retrato de Lúcia vai levantar o primeiro prêmio.
Eu serei feliz com Lúcia...



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[1] Autoria desconhecida.

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